23 de setembro - Dia da Visibilidade Bissexual



O Conselho Regional de Psicologia de Pernambuco - 2ª Região (CRP-02) através do Grupo de Trabalho em Gênero e Sexualidade, vêm por meio desta nota visibilizar o dia 23 de setembro, demarcado há apenas 17 anos como o Dia da Visibilidade Bissexual.

Este dia possui característica diferenciada, pois ao contrário de outros eventos do movimento LGBT surgiu como uma resposta ao preconceito e a invisibilização de pessoas bissexuais não só na sociedade como um todo, mas também especificamente dentro da comunidade LGBT.

Pessoas heterossexuais e homossexuais não costumam sofrer preconceito dos/as parceiros/as ou da própria comunidade por suas sexualidades, já pessoas bissexuais estão na posição peculiar de estarem sujeitas ao “duplo estigma”, ou seja, serem deslegitimadas ou negadas tanto pela população heterossexual como por gays e/ou lésbicas. Isso acontece porque nossa sociedade é estruturada dentro de uma norma binária e monossexista. No imaginário monossexual, ou você sente atração por homens ou por mulheres.Assim,pessoas não-heterossexuais são sempre lidas automaticamente como gays ou lésbicas.Nessa lógica,ou a bissexualidade não existe ou não é válida – ao menos, não tão válida quanto as outras sexualidades, como se as monossexualidades (atração por um só gênero) fossem mais legítimas ou verdadeiras.A bissexualidade é uma vivência afetivo-sexual que desafia e aponta os limites desse binarismo monossexista.

Os processos de autodescoberta da sexualidade têm desafios independente de qual seja a orientação sexual, mas no caso de pessoas bissexuais existe o sofrimento advindo da invalidação constante de seus desejos, fazendo com que o processo de auto aceitação seja diferenciado, por costumarem ter suas identidades deslegitimadas ao serem sempre atreladas a confusão, indecisão, promiscuidade e termos afins. Para pessoas bissexuais, ‘sair do armário’ não é apenas um marco, como sair de uma posição e ocupar outra, mas um processo contínuo de quebra de mitos e estereótipos, por ser necessário justificar-se e combater os estigmas e preconceitos cotidianamente, enfrentando as negações e dúvidas impostas, ao passo que a cada novo relacionamento são exigidas validações da própria sexualidade. Alguns dos preconceitos específicos enfrentados incluem a crença de que pessoas bissexuais nunca conseguirão ter um relacionamento monogâmico, por acreditar que sempre precisarão se relacionar com mais de uma pessoa para se satisfazer, crença essa que também reforça a vinculação da bissexualidade a comportamentos tidos como “promíscuos” ou infiéis.

A visão do senso comum costuma ver a bissexualidade como uma indecisão (que em algum momento a pessoa deve se decidir) e/ou como uma fase transitória entre uma orientação e outra (que deve em algum momento “descobrir” a que gênero – no singular –são sexualmente atraídos).Assim, passam a ser julgadas/os pelo gênero das pessoas com quem estão se relacionando. Quando estão com alguém do gênero oposto, são definidas/os como heterossexuais, e quando estão com alguém do mesmo gênero, são definidas/os como lésbicas ou gays, e as experiências que se desviaram dessas definições passam a ser consideradas “aventuras” ou fase de curiosidade. Por outro lado, costuma-se enxergar a bissexualidade como duas metades que se completam, a metade heterossexual e a metade homossexual. Como se ao estar com alguém do gênero oposto, a pessoa bissexual estivesse exercendo seu lado heterossexual, e ao estar com alguém do mesmo gênero, estivesse exercendo sua homossexualidade. Assim, a bissexualidade é vista como sendo composta por duas sexualidades que se misturam, como uma combinação das sexualidades mossexuais: uma hora você é hétero, outra hora você é lésbica ou gay.

É preciso então ressaltar que a bissexualidade por si só é uma sexualidade completa e legítima, e não uma soma de outras orientações sexuais. A pessoa bissexual em relacionamento com alguém do gênero oposto não “estava” hétero, continua sendo bissexual, da mesma forma que quando estava com alguém do mesmo gênero não “estava” lésbica ou gay, continuava sendo bissexual. Não devemos definir a sexualidade de uma pessoa bissexual a seu relacionamento atual, pois assim reduzimos seus processos de auto-descoberta e aceitação. Devemos entender que as vivências são diversas, que sentir atração por mais de um gênero não representa indecisão, e que as sexualidades das pessoas não devem ser definidas ou validadas pelo gênero daqueles/as com quem elas se relacionam.

Reconhecer a totalidade dessas existências a partir do respeito a diversidade significa entender que todas as vivências são diferentes e específicas, mas isso não as torna inferiores, menos válidas ou até menos dolorosas.É importante lembrar que estamos falando da sexualidade que tem taxas mais altas de problemas de saúde e mental. Alguns estudos apontam que pessoas bissexuais apresentam mais chance de sofrer com quadros de depressão e ansiedade, distúrbios de humor, automutilação, distúrbios alimentares, pensamentos suicida e violência doméstica, mais do que pessoas heterossexuais, lésbicas ou gays. A invisibilidade tem um custo real na vida dessas pessoas, e os estigmas e preconceitos as atingem o bastante para minar suas autoestimas, diminui-las e isola-las de espaços políticos, já que frequentemente não se sentem incluídas ou pertencentes nem em espaços hétero, nem em espaços lésbicos ou gays.

Nos referimos aqui a bissexualidade pelo marco deste dia, mas ressaltamos a importância de considerar as sexualidades não-binárias ou não-monossexuais como um todo, pois há muitos problemas enfrentados por todos aqueles cuja atração afetiva-sexual não é baseada em um gênero tampouco em mais de um gênero. É válido relembrar que a perspectiva de “tratar” a orientação sexual de uma pessoa como doença é um ato anti-ético e desrespeitoso frente os procedimentos e técnicas reconhecidas pela psicologia como profissão, assim como demonstra ignorância sobre os conhecimentos científicos produzidos sobre sexualidades.

O dia da visibilidade bissexual surgiu para reafirmar que ser bissexual não significa estar confusa/o, insegura/o, tampouco significa que precise ‘se decidir’, e para que possamos promover o reconhecimento da legitimidade dessa vivência afetiva-sexual que não pode mais ser ignorada, pois pessoas bissexuais existem, resistem e são dignas de respeito.

Devemos enquanto psicologia estar atentas/os às manifestações de violência e deslegitimação que muitas vezes são sutis, e fortalecer as perspectivas que compreendem a bissexualidade como mais uma possibilidade dentre toda a diversidade de sexualidades possíveis. É por uma sociedade mais empática que a psicologia, norteada pelos princípios fundamentais da declaração universal dos direitos humanos, reafirma seu compromisso e sua luta diária pelo respeito as diversidades sexuais e de gêneros.

Fonte de pesquisa: Folha de São Paulo

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